Cristiano Araújo: quem foi o cantor sertanejo que morreu há 10 anos e deixou um legado precoce e inesquecível
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Em 1959, a música sertaneja brasileira deu um passo decisivo rumo à inovação. À frente do movimento estava Tião Carreiro, nome artístico de José Dias Nunes, mineiro de Monte Azul, que não apenas dominava a viola como poucos, mas criou um novo gênero dentro do próprio gênero: o pagode de viola. Com batidas sincopadas e […]
Em 1959, a música sertaneja brasileira deu um passo decisivo rumo à inovação. À frente do movimento estava Tião Carreiro, nome artístico de José Dias Nunes, mineiro de Monte Azul, que não apenas dominava a viola como poucos, mas criou um novo gênero dentro do próprio gênero: o pagode de viola. Com batidas sincopadas e ponteios sofisticados, Tião transformou a sonoridade caipira, inserindo ritmo e modernidade sem perder a alma rural.
A importância de Tião Carreiro para a música sertaneja ultrapassa a criação de um estilo musical. Ele foi um divisor de águas, responsável por consolidar a viola como elemento central do sertanejo de raiz, ao lado de parceiros como Pardinho, com quem gravou mais de 50 discos. A dupla se tornou uma das mais prolíficas e influentes do século XX, especialmente entre os anos 1960 e 1980, período em que a música sertaneja passou por intensa transformação, indo dos programas de rádio do interior aos grandes palcos da televisão nacional.
A consagração veio com músicas como Pagode em Brasília, Rio de Lágrimas, Rei do Gado e Boi Soberano. Em Pagode em Brasília, por exemplo, Tião Carreiro transformou a epopeia da construção da nova capital federal num sucesso radiofônico, elevando o cotidiano rural à condição de narrativa política. Em outras canções, temas como a seca, a migração para a cidade grande, o sofrimento no campo e a devoção popular ecoavam com realismo e melancolia, construindo uma ponte simbólica entre o sertão e a cidade.
O pagode de viola criado por Tião Carreiro não guarda relação com o pagode urbano que se consolidaria a partir dos anos 1980. O seu era rural, instrumentalmente complexo e emocionalmente denso. O modelo de batida da viola criado por ele virou escola e hoje é referência entre instrumentistas de música caipira, sendo replicado e estudado por músicos em universidades, conservatórios e rodas de violeiros pelo país.
Mesmo após sua morte, em 1993, vítima de complicações causadas pelo diabetes, Tião Carreiro permanece vivo na memória popular e nos palcos. Releituras de suas músicas, tributos e relançamentos reforçam a relevância de sua obra. Nomes como Zezé Di Camargo & Luciano, Chitãozinho & Xororó e Bruno & Marrone já declararam publicamente a importância da obra de Tião para a consolidação de suas próprias carreiras. Para muitos, ele é o elo entre o sertanejo tradicional e o sertanejo romântico que se tornaria hegemônico nos anos 1990.
A análise de sua trajetória também revela o contraste entre o sertanejo de raiz e o pop-sertanejo atual. Enquanto Tião Carreiro cantava sobre o lavrador, a lida, o sofrimento e a saudade, o gênero hoje é majoritariamente ocupado por narrativas urbanas, festas, consumo e relações amorosas idealizadas. Essa mudança de foco tem levado parte do público e da crítica a revisitar os fundamentos do sertanejo, e nesse processo, a figura de Tião Carreiro volta a ganhar centralidade como símbolo de autenticidade.
Na comparação histórica, a contribuição de Tião Carreiro à cultura popular brasileira se aproxima da de nomes como Luiz Gonzaga no forró e Pixinguinha no choro: fundadores de estilo, inventores de linguagem e intérpretes de um Brasil profundo. Sua técnica de viola, seu repertório e sua capacidade de renovar a tradição sertaneja o tornam uma figura incontornável para quem deseja entender a evolução da música brasileira no século XX.
Ao completar 90 anos de nascimento em 2024, o nome de Tião Carreiro ressurge como objeto de estudo, homenagens e reconhecimento institucional. A memória do artista ajuda a preencher uma lacuna na compreensão do Brasil rural e de sua expressividade cultural. E, sobretudo, reafirma que sem a viola de Tião, a música sertaneja não teria se tornado o fenômeno de massa que é hoje.
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